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sexta-feira, 24 de outubro de 2014

A lei de terras de 1850

O solo vira mercadoria - A lei de terras de 1850

Durante o século 19, nos países Latino-americanos houve uma série de reformas liberais nas leis que proporcionaram um avanço do capitalismo na região: a liberalização do comércio, a abolição da escravidão e servidão jurídica (na América espanhola) e a transformação da terra em mercadoria.
No Brasil, a partir de 1.822 as condições para ter acesso a terras sofreram mudanças. As doações de sesmarias – que existiam desde o início do século 16 – foram eliminadas. Mas, não houve nenhuma outra lei que a substituísse. Então, entre 1822 e 1850, os fazendeiros aproveitaram para expandir suas terras para além de suas cercas, tomando muitas áreas antes vazias. Nas proximidades dessas terras havia pequenos posseiros e  comunidades indígenas, mas os grandes donos de terras tomavam essas terras, utilizando-se de meios violentos como ameaças e assassinatos de pessoas, queima das plantações, entre outros.
Só em 1850, houve uma nova lei para organizar a distribuição de terras no país. O objetivo dessa lei era impedir que os escravos que estavam se tornando libertos e os imigrantes que começam a vir para o Brasil pudessem ter terras, sendo assim, forçados a trabalhar para os grandes fazendeiros do café!!
A partir da Lei de 1850 o solo (que antes era doado pelo rei, como as sesmarias) passou a ser tratado como mercadoria, produto que pode ser vendido e comprado. Assim, só era permitido a uma pessoa usar um lote de terras, se esta tivesse o comprovante (certificado) de propriedade, ou seja, de compra.
A lei de 1850 previa que: (a) os lotes só seriam vendidos em grandes proporções de terra, e (b) os lotes teriam um preço alto fixado pelas autoridades provinciais (estaduais) de cada região. Dessa forma, sem dinheiro, os ex-escravo e os imigrantes não conseguiam nenhum pedaço de terra para plantar e sobreviver, sendo assim forçados a trabalhar para os grandes fazendeiros. Em São Paulo, desde de 1844 plantava-se o café em escala comercial e, como havia uma possibilidade de grandes lucros, a necessidade de mão-de-obra era cada vez maior.
A retirada destas terras das mãos de grupos ou instituições que as tinham há muito tempo também ocorreu. A única exceção foi a Igreja Católica que não perdeu suas terras no Brasil. Mas, até os grupos indígenas, que eram os verdadeiros donos das terras, pois estavam com seu uso (posse) há mais tempo que todo mundo, perderam suas terras. Havia na lei de 1850, uma cláusula determinando o governo como responsável para conseguir terras para as comunidades indígenas. Mas nem o governo imperial, nem os da República resolveram esse problema que eles mesmos criaram para os índios. As comunidades que se utilizavam das terras contínuas às cidades também dançaram...
Como definiu José de Souza Martins, a Lei de terras demonstra que “num regime de terras livres, o trabalho tinha que ser cativo; num regime de trabalho livre, a terra tinha que ser cativa”. (O cativeiro da terra, p. 32).
Em 1854, houve a regulamentação da lei de 1850. Através daquela, definiu-se, por exemplo, que as posses de terras anteriores á lei de terras seriam regularizadas pelos antigos posseiros. No entanto, os grandes fazendeiros se aproveitaram da situação para, por exemplo, aumentar (de novo!) suas terras. Na época, bastava ordenar os escravos para puxar os mourões pra frente. Também os funcionários do Estado que fiscalizariam o tamanho dos lotes de terras eram sem remuneração, isto é, alvo fácil para corrupção e suborno…
Essas mudanças não foram aproveitadas pelos pequenos posseiros e/ou pequenos agricultores, pois além de não saberem o que estava ocorrendo (lembre-se: os grandes fazendeiros eram deputados e senadores da época); além disso, os pequenos posseiros não compreendiam que o regime legal de acesso às terras havia mudado; essas mudanças institucionais não eram algo que uma população em maioria analfabeta compreenderia facilmente (claro que os grandes fazendeiros, analfabetos como os outros, não entendiam também; mas aí, outros fazendeiros próximos os avisavam das mudanças).
Pode parecer estranho, mas esta e outras mudanças que ocorreram durante o 2° Reinado foram todas realizadas pelo Partido Conservador (deveria ser o liberal, né?!). Eram os conservadores que procuravam mudar as instituições do país a fim de adequá-las ao capitalismo. Os liberais queriam a manutenção da escravidão e do país do jeito que ele estava (eram, portanto, conservadores!). É por isso que as mudanças feitas no 2° Reinado são, muitas vezes, mais avançadas do que aquelas feitas pelos republicanos liberais depois de 1889 (Proclamação da República); por exemplo: em 1881, o império fez uma reforma no código eleitoral que expandiu o número de votantes no país; em 1890, a Constituição republicana (de inspiração liberal) reduziu o número de votantes (!) ao decretar que somente os alfabetizados teriam direito ao voto...
Além da Lei de terras, houve em 1850 mudanças no código criminal, no código comercial e a Lei Eusébio de Queiroz – que proibia o tráfico de escravos (era o inicio da abolição da escravidão no país).

Leitura complementar :
A “grilagem” - Desde 1850, existe uma prática muito comum para burlar a lei e tomar terras vazias (públicas) e dos pequenos agricultores, fazendo a família deste abandonar as terras. Isso ocorre por meio da “Grilagem”: o grileiro cria um certificado falso de propriedade de terras, depois coloca o papel em uma gaveta fechado com grilos e folhas verdes junto. Comendo as folhas, o grilo defeca no papel este amarela, parecendo velho. Assim, o grileiro usa este “certificado de propriedade” para regularizar a terra junto ao Estado e aí, atacando os pequenos agricultores os expulsam das terras. Em seguida, o grileiro vende as terras com grandes lucros aos fazendeiros. Essa é uma forma de enganar os pequenos agricultores e trabalhadores e que usa uma terra devoluta (vazia, pública) para ganhar dinheiro. Isso ocorre desde 1850 e até no Brasil atual. Acredite, se puder...