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segunda-feira, 26 de outubro de 2020

O governo JK: desenvolvimentismo e dependência

 O governo JK: desenvolvimentismo e dependência



Juscelino Kubitschek de Oliveira (PSD) era mineiro, foi prefeito de Belo Horizonte a partir de 1938, deputado na Constituinte de 1946 e governador de Minas Gerais a partir de 1950.

 

Antes de ser presidente, JK já se destacava por seu interesse pelo modernismo, tanto na arquitetura quanto na arte. Quando foi prefeito de BH, por exemplo, construiu a igreja na sede do governo mineiro, o “Palácio da Pampulha”, com seu design modernista (projeto desenhado por Oscar Niemeyer); além disso, fez exposições de arte moderna – o que demonstra uma visão de “desenvolvimentismo modernizador”.

 


JK foi o primeiro político brasileiro a ter um programa de governo (coisa rara para a época). Em 1954, o PSD o lança como candidato a presidência: seu “Plano de Metas” tinha como slogan fazer o Brasil crescer “50 anos em 5!”. A proposta econômica básica de JK era acelerar o desenvolvimento do Brasil à custa de uma industrialização rápida, contando com a entrada de capitais estrangeiros nos setores de ponta da indústria. Essa ideia é fruto de uma ideologia sistematizada pela CEPAL (Comissão Econômica Para a América Latina) na época: o desenvolvimentismo.

 

O Plano de Metas de JK tinha 51 metas, prometendo modernizar o país e, para marcar seu governo, realizaria o sonho das elites de 1822 e dos republicanos de 1889: construir uma capital no centro do país.

 

 


Mas quais as características de JK enquanto político?

 

Ele era um democrata, pois defendia, acima de tudo, a manutenção da democracia liberal representativa. Na campanha de 1954 setores da UDN (inimigas de JK também) propuseram que deveria haver uma única candidatura para a eleição presidencial (obviamente, da UDN!!). JK não aceitou e peitou os udenistas. Ele conseguiu que Plínio Salgado (ex-integralista) mantivesse sua candidatura. Em 1958, JK deu liberdade para o PCB se reorganizar (pois estava cassado e ilegal desde junho de 1947). Em 1958, JK retirou da justiça o processo contra os membros do partido. JK pediu também ao PCB que não fizesse grandes greves e agitações e o “partidão” aceitou esse “acordo”. Até a UNE (União Nacional dos Estudantes) foi recebida por JK em 1958 para discutir a política educacional e por que protestam contra a visita do secretário de Estado norte-americano John Foster Dulles. Em 1959, Fidel Castro (líder da Revolução Cubana, um movimento a princípio, antiamericano) vem ao Brasil e se reúne com JK.

 

Em relação à oposição, o presidente foi bem pontual: depois de Carlos Lacerda (UDN) acusá-lo de ser um governo de “fraudes”, JK o proíbe de falar a TV.

 


Com a fundação do ISEB (Instituto Superior de Estudos Brasileiros) - importante centro de pesquisas para o pensamento nacional–desenvolvimentista - JK tentou agradar o bloco nacional-estatista da sociedade, dando-lhes uma liberdade de pensamento. Lembre-se: nas décadas de 1940 e 1950 o sentimento de nacionalismo era muito forte na sociedade e havia um forte legado de Getúlio Vargas como nacional-estatista.

 

Como seu “Plano de Metas” tinha necessidade de capital estrangeiro para “modernizar” o país, Juscelino abriu o país à entrada do capital estrangeiro, sem nenhum freio ou forma de controle sobre os lucros que as empresas multinacionais retiravam do Brasil. Isso explica, em parte, por que JK é até hoje tão adorado pelas grandes empresas e bancos do capital estrangeiro (o chamado “mercado”). Mas veja a contradição do desenvolvimentismo: quanto mais o país se industrializava, mais dependente e fraco economicamente ficávamos, pois o capital que industrializou o Brasil nessa época NÃO era nacional (o que nos diferencia muito da Inglaterra, França Alemanha, EUA etc.). PERCEBA: Desenvolvimento econômico para quem? A que preço (explorar a população, poluir o meio-ambiente etc.)? Só enriquecer uma pequena parcela da população (as "elites") não basta. Todos os países desenvolvidos citados acima DISTRIBUÍRAM riquezas à população em seus processos de desenvolvimento.

 


Ao colocar em pratica seu Plano de governo em prática, JK aumentou a dívida externa do país de 3 para 5 bilhões de dólares. Ele chegou a romper com o F.M.I. (Fundo Monetário Internacional) em 1959, pois o órgão internacional exigia que JK desacelerasse a economia (o que impediria seu Plano de Metas). O aumento da dívida externa é ruim? Sim, mas não só por que ficamos devendo mais, mas principalmente por que passamos a ser cada vez mais dependentes dos bancos e países estrangeiros.

 

Como resultado de seu Plano de Metas, as obras que JK faz no país atendem as necessidades de uma nova classe média consumista (que conseguia empregos em multinacionais). Estradas interligando o país servem aos interesses das multinacionais montadoras de automóveis, como também os “sacoleiros” da classe média que curtem o “prazer” de andar de carro. Estes acham transporte coletivo um “horror” e, inconscientemente, tendem a reforçar o individualismo dos carros individuais poluidores, viagens solitárias e fechadas pelo vidro do carro ante a realidade da sociedade em que vivem (uma forma de alienação). O trem, o mais usado tipo de transporte público que as pessoas pobres usavam, foi abandonado por JK.  Mesmo os trabalhadores que foram construir Brasília (os chamados “candangos”) ficaram – ao final da obra – nas “cidades satélites”, verdadeiros depósitos de seres humanos, com uma enorme falta de estrutura urbana e sujeitos a miséria, drogas, doenças etc. (Escute a música “Faroeste caboclo” da banda de Brasília, Legião Urbana e venha um exemplo disso).

 


O plano econômico de JK se baseava na intervenção estatal (em Keynes); na definição de setores prioritários para investimento e, consequentemente, na possibilidade de haver inflação (elevação de preços dos produtos). O resultado foi que os salários dos trabalhadores não acompanhavam a subida dos preços. A entrada de capital estrangeiro e as importações faziam os preços subirem mais ainda. Não por acaso, em 1957, há manifestações e greves de trabalhadores em São Paulo com cerca de 400 mil participantes.

 

 


Mas, o que aconteceu no governo JK?

 

Como na época, por questões de cálculos eleitorais, o Congresso Nacional era formado por uma maioria de deputados e senadores vindo do campo e contrários à modernização). No início de seu governo JK instalou os “Grupos de Trabalho Executivos” (GTE’s) e os “Grupos de Trabalho Administrativos” (GTA’s). Eram grupos de empresários, tecnocratas, burocratas, engenheiros e militares que estabeleciam as formas de administrar e fazer os planos do governo andarem, especialmente na questão da construção de Brasília. Com esses grupos, JK retirou do Congresso Nacional a função de auxiliar a máquina administrativa a funcionar, pois o orçamento dos planos passaram todos para as mãos desses grupos. JK deu uma “chega pra lá” nos congressistas. No entanto, dentro dos GTE’s e GTA’s, a corrupção rolava solta. Afinal, a construção de uma cidade inteira em apenas 5 anos (!) não podia perder tempo com burocracias dos processos legais para fazer obras públicas. Os membros desses grupos davam uma ‘for$$$$inha” aos órgãos e pessoas que acelerassem os processos liberação da papelada para a construção.

 

No projeto para a construção de Brasília, o “Plano Piloto” de Lúcio Costa (na forma de um avião) é escolhido em um concurso público – no qual, projetistas e arquitetos estrangeiros não puderam participar, pois JK dizia que era uma “questão de nacionalismo”. O projeto arquitetônico foi do já conhecido Oscar Niemeyer. A cidade foi feita na forma de um avião para representar a entrada do Brasil na “era das máquinas”. Imaginava-se, na época que a rápida industrialização iria colocar o país lado a lado com os países desenvolvidos...

 


Além disso, como Brasília foi projetada para automóveis e não para seres humanos (!), as avenidas seriam muito largas e não deveriam ter impeditivos à rápida circulação de carros – símbolos da era moderna. Por isso, na época, havia pouquíssimos semáforos nas ruas e a cidade foi, por décadas, a campeã mundial de atropelamento (!).

 


Pra piorar, as pessoas que construíram Brasília NÃO dormiam perto da obra. Iam, todos os dias, do trabalho para “casa” (alojamentos em cidades-dormitórios), o que significava uma distância de, em média, 23 km (!). Essa segregação espacial foi fruto de uma ideia de que, como cidade do futuro, Brasília não poderia ter pobres (!), pois estes iriam “sujar” a imagem de futuro que a cidade representaria para o Brasil.

 


A ideia de fazer a cidade como um símbolo de diferenciação foi muito marcante. Diferentes atividades não deveriam se misturar. Por isso, a cidade foi pensada como algo setorizada. Diferente de uma cidade comum, como São Paulo, Rio de Janeiro, Recife etc., Brasília foi dividida por setores separados, assim há na cidade setor comercial, setor governamental, setor bancário, setor de diversão etc. As funções da cidade são separadas, como as pessoas.

 


Na maior parte da cidade, as moradias são amplas, luxuosas e com belas áreas verdes (jardins). Essas casas foram feitas para os assessores de políticos ou para os próprios deputados, senadores, ministros etc. Nos bairros residenciais há apenas 1 quarteirão com comércio. Na cidade não há ruas com nomes de pessoas, mas códigos como Via W3 Sul ou SQN 54, etc. Na Asa Sul da cidade há “apertamentos” para os milhares de funcionários públicos concursados – que trabalham para o governo federal e ganham pouco – se espremerem em poucos metros quadrados.

 




Com incentivo do governo JK à entrada de capital estrangeiro no país, empresas como Ford, Volkswagen e Mercedes Benz se interessam por produzir automóveis no Brasil. Muitas dessas empresas ganharam terreno (especialmente em São Bernardo do Campo - SP), isenção (não pagamento) de taxas de luz e água por décadas, redução de impostos etc.

 

O projeto de JK criava grandes obras: usinas hidrelétricas e estradas, como a Belém-Brasília. No entanto, os estados do sul do país reclamavam, pois foram (novamente) deixados de lado.

 


Em 1960, antes de deixar a presidência, JK inaugura sua maior obra e grande símbolo de seu governo: Brasília. Lentamente a nova capital vai recebendo os órgãos administrativos, que são transferidos do Rio de Janeiro para o planalto central do país (processo que só irá acabar em 1975).

 

Em 1958, o governo JK enfrenta a Revolta de Jacareacanga. Alguns membros da FAB (Força Aérea Brasileira) se rebelaram contra uma ordem do governo de que deveriam carregar tijolos em São Paulo e levá-los para Brasília (afinal, a construção feita 24 horas por dia, não poderia parar!). Imagine o preço do tijolo o quanto saiu... pagar muito em algo para acelerar uma obra pública também é corrupção.

 


No Clube Militar do Exército, há eleições muito disputadas que elege oficiais nacionalistas. Estes vencem os “esguianos” (da E.S.G. - Escola Superior de Guerra) liderados por Humberto de A. Castelo Branco. Está criado um racha nas Forças Armadas que só se resolverá com o golpe de 1964.

 

Além de seu maior legado, Brasília, JK deixou o Brasil mais dependente de bancos e empresas multinacionais (capital estrangeiro), mergulhado numa crise econômica (devido à inflação) e com diversos escândalos de corrupção (devido aos GTA’s e GTE’s).