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domingo, 10 de maio de 2020

A Revolta da Chibata (1910)


A Revolta da Chibata (1910, Rio de Janeiro)

No início do século 20, as condições de disciplina na Marinha eram muito rígidas. Embora a escravidão tivesse acabado há 22 anos, existiam heranças dela nessa instituição. Contra isso e outras coisas ocorreu uma revolta em 1910. Os motivos da revolta são: contra a chibata, pois os marinheiros recebiam castigos físicos. Além disso, os marujos reclamavam constantemente de receberem comida podre nos navios; enquanto que – nas mesas ao lado deles, os almirantes comiam até presunto e chocolate (produtos importados à época). Também como a maioria dos marujos eram negros e os almirantes eram brancos, haviam vários casos de racismo na instituição.


Como os marujos viajavam o mundo, alguns deles ficaram sabendo da revolta de marujos na Rússia em 1905. Um deles, João Cândido, guardou até um recorte de jornal sobre o ocorrido e o mostrava para os colegas, como exemplo.
Em 1910, a marinheira brasileira acabara de receber um grande navio de guerra, o “Minas Gerais”. O governo brasileiro estava pagando o navio ainda. Além disso, o governo estava enfraquecido com a “quebra” dos governos das oligarquias e a derrota da campanha civilista encabeçada por Rui Barbosa. (O presidente que acabara de assumir era o militar Hermes da Fonseca).

                                                          Hermes da Fonseca  e Rui Barbosa

A revolta aconteceu na mar. Os marujos anunciaram a tomada de alguns navios (inclusive o Minas Gerais). Houve luta em alguns navios, pois alguns almirantes não aceitavam aquilo e um deles foi morto no conflito. Seu corpo, junto a um Manifesto anunciando a revolta foi enviado a capital.


A reação da Marinha foi tentar convencer o governo de que deveriam afundar os navios. Mas o presidente, pressionado pelo senado (e pelo senador Rui Barbosa) buscou as duas possibilidades: atacar e/ou negociar. Na verdade, nenhuma das duas estava descartada.
O líder da revolta era João Cândido, chamado pelos marujos de "almirante Negro", pois toda a organização e ação da revolta saíram de sua cabeça. Isso chocou os almirantes, pois eles eram brancos e racistas. Para eles, era impensável um almirante ser negro... Além disso, havia a questão da insubordinação dos marujos à autoridade dos almirantes.

João Cândido
                                                                                                   

No entanto, quando João Cândido ficou sabendo que a Marinha e o governo não decidiam se atacavam ou não (afinal, seria um desastre militar e financeiro afundar barcos como o Minas Gerais, que o país ainda estava pagando) e, no Senado, havia pessoas dispostas a negociar, mandou outra carta para a capital, dando o xeque-mate no governo/marinha: os revoltosos ameaçavam bombardear o Rio de Janeiro, caso o governo não atendesse as exigências dos marujos...
Imprensa e população da cidade morriam de medo de que os marujos cumprissem sua promessa. O governo enfim decidiu negociar...
Nas negociações, os revoltosos decidiram colocar mais uma reivindicação: a não perseguição dos líderes do movimento. Feito o acordo, os marujos voltaram ao Rio de Janeiro, onde foram recebidos com festa. Mas, no início de 1911, quando a “poeira já havia baixado”, o governo se aproveitou da repressão a uma revolta de soldados no Rio de Janeiro para prender oposições, jornalistas, prostitutas do porto, os líderes da revolta da Chibata etc.
João Cândido e outros foram demitidos da Marinha. Ficaram presos em um navio-prisão. Voltando a terra tempos depois, foram colocados em outra prisão – embaixo de um prédio público dos departamentos de segurança da época. Na cela, os policiais reprimiam as lideranças da revolta, espancando-os. Além disso, jogavam cal no chão, o que aumentava a dor nos machucados e queimava a pele das pessoas. A maioria morreu ali mesmo.
O único que saiu de lá com vida foi João Cândido. De lá, foi colocado em um hospício – embora não estivesse louco. Tempos depois, jornalistas que pensavam em escrever a História da revolta eram ameaçados nas ruas...
A História da “Revolta da Chibata” só foi escrita décadas depois. Pior que isso, as famílias dos revoltosos demitidos (porque lutavam por direitos!!) passaram por gigantescas dificuldades financeiras e entrando na justiça para reaver seus direitos. Por incrível que pareça, o processo não foi decidido até hoje...
João Cândido, o “almirante Negro” morreu apenas em 1969 com 89 anos... Teimou em viver contra todos aqueles que queriam vê-lo morto e esquecido, se tornando símbolo da luta dos marujos por condições mais dignas de vida.

Estátua de João Cândido no RJ