A Revolta da Chibata (1910, Rio de Janeiro)
No início do século 20, as
condições de disciplina na Marinha eram muito rígidas. Embora a escravidão
tivesse acabado há 22 anos, existiam heranças dela nessa instituição. Contra
isso e outras coisas ocorreu uma revolta em 1910. Os motivos da revolta são: contra
a chibata, pois os marinheiros recebiam castigos físicos. Além disso, os
marujos reclamavam constantemente de receberem comida podre nos navios;
enquanto que – nas mesas ao lado deles, os almirantes comiam até presunto e
chocolate (produtos importados à época). Também como a maioria dos marujos eram
negros e os almirantes eram brancos, haviam vários casos de racismo na instituição.
Como os marujos viajavam o
mundo, alguns deles ficaram sabendo da revolta de marujos na Rússia em 1905. Um
deles, João Cândido, guardou até um recorte de jornal sobre o ocorrido e o
mostrava para os colegas, como exemplo.
Em 1910, a marinheira
brasileira acabara de receber um grande navio de guerra, o “Minas Gerais”. O
governo brasileiro estava pagando o navio ainda. Além disso, o governo estava
enfraquecido com a “quebra” dos governos das oligarquias e a derrota da
campanha civilista encabeçada por Rui Barbosa. (O presidente que acabara de
assumir era o militar Hermes da Fonseca).
Hermes da Fonseca e Rui Barbosa
A revolta aconteceu na mar. Os
marujos anunciaram a tomada de alguns navios (inclusive o Minas Gerais). Houve
luta em alguns navios, pois alguns almirantes não aceitavam aquilo e um deles
foi morto no conflito. Seu corpo, junto a um Manifesto anunciando a revolta foi
enviado a capital.
A reação da Marinha foi tentar
convencer o governo de que deveriam afundar os navios. Mas o presidente,
pressionado pelo senado (e pelo senador Rui Barbosa) buscou as duas
possibilidades: atacar e/ou negociar. Na verdade, nenhuma das duas estava
descartada.
O líder da revolta era João
Cândido, chamado pelos marujos de "almirante Negro", pois toda a
organização e ação da revolta saíram de sua cabeça. Isso chocou os almirantes,
pois eles eram brancos e racistas. Para eles, era impensável um almirante ser negro... Além disso, havia a questão da
insubordinação dos marujos à autoridade dos almirantes.
No entanto, quando João Cândido
ficou sabendo que a Marinha e o governo não decidiam se atacavam ou não
(afinal, seria um desastre militar e financeiro afundar barcos como o Minas
Gerais, que o país ainda estava pagando) e, no Senado, havia pessoas dispostas
a negociar, mandou outra carta para a capital, dando o xeque-mate no
governo/marinha: os revoltosos ameaçavam bombardear o Rio de Janeiro, caso o
governo não atendesse as exigências dos marujos...
Imprensa e população da cidade
morriam de medo de que os marujos cumprissem sua promessa. O governo enfim
decidiu negociar...
Nas negociações, os revoltosos
decidiram colocar mais uma reivindicação: a não perseguição dos líderes do
movimento. Feito o acordo, os marujos voltaram ao Rio de Janeiro, onde foram
recebidos com festa. Mas, no início de 1911, quando a “poeira já havia baixado”,
o governo se aproveitou da repressão a uma revolta de soldados no Rio de
Janeiro para prender oposições, jornalistas, prostitutas do porto, os líderes
da revolta da Chibata etc.
João Cândido e outros foram
demitidos da Marinha. Ficaram presos em um navio-prisão. Voltando a terra
tempos depois, foram colocados em outra prisão – embaixo de um prédio público
dos departamentos de segurança da época. Na cela, os policiais reprimiam as
lideranças da revolta, espancando-os. Além disso, jogavam cal no chão, o que aumentava
a dor nos machucados e queimava a pele das pessoas. A maioria morreu ali mesmo.
O único que saiu de lá com
vida foi João Cândido. De lá, foi colocado em um hospício – embora não
estivesse louco. Tempos depois, jornalistas que pensavam em escrever a História
da revolta eram ameaçados nas ruas...
A História da “Revolta da
Chibata” só foi escrita décadas depois. Pior que isso, as famílias dos
revoltosos demitidos (porque lutavam por direitos!!) passaram por gigantescas
dificuldades financeiras e entrando na justiça para reaver seus direitos. Por
incrível que pareça, o processo não foi decidido até hoje...
João Cândido, o “almirante
Negro” morreu apenas em 1969 com 89 anos... Teimou em viver contra todos
aqueles que queriam vê-lo morto e esquecido, se tornando símbolo da luta dos
marujos por condições mais dignas de vida.